Foto: Jonas Pereira/Agência
Senado
O
fundo de financiamento da educação básica no Brasil tem prazo para acabar. No
dia 31 de Dezembro de 2020, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação
Básica (Fundeb) perderá a validade.
Tornar
permanente essa fonte de recursos depende do Congresso Nacional, que também
analisa a possibilidade de aumentar a participação da União com mais
investimento de verbas federais para manter o funcionamento de creches,
educação infantil, ensinos fundamental e médio e educação de jovens e adultos
nos estados e municípios.
Só
em 2019, dos R$ 248 bilhões aplicados nas escolas públicas do país, R$ 156
bilhões (65% do total) saíram do Fundeb.
O
fundo recolhe verbas públicas e reparte o montante entre todas as 27 redes
estaduais e 5.570 redes municipais de ensino. Ele é composto por 20% de
diversas receitas, entre elas o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e
Serviços (ICMS) e o Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA).
Além
disso, uma parte dos recursos recolhidos é reservada às redes de ensino que
ficaram com os valores mais baixos, amenizando as desigualdades regionais no
financiamento da educação.
O
dinheiro extra da complementação federal é distribuído entre todos os estados
desfavorecidos até que eles alcancem um mesmo patamar mínimo por matrícula. No
ano passado, nove Fundebs ganharam esse reforço: no Maranhão, Pará, Amazonas,
Piauí, Bahia, Ceará, Alagoas, Pernambuco e Paraíba. Assim, esses estados
atingiram o valor mínimo previsto por aluno, que foi de R$ 3.240. Sem o fundo,
o investimento para cada estudante maranhense, por exemplo, seria de apenas R$
1,7 mil (R$ 141 por mês).
"Sem o Fundeb, fica decretada a falência do ensino público no Brasil", afirmou
Dário Berger (MDB-SC), presidente da Comissão de Educação (CE), que elegeu o
fundo como a política pública a ser avaliada pelo colegiado em 2019.
Com
duração de 14 anos, o Fundeb foi criado em 2007 para substituir outro fundo,
dedicado somente à manutenção do ensino fundamental — o Fundef, que vigorou
entre 1998 e 2006.
Para onde vai o dinheiro
Pelo
menos 60% dos recursos do Fundeb devem ser usados na remuneração de
professores, diretores e orientadores educacionais. O restante vai para
despesas de manutenção e desenvolvimento do ensino, como o pagamento de outros
profissionais ligados à educação, a compra de equipamentos e a construção de
escolas.
Dário
Berger defende que o Parlamento vincule o novo Fundeb à melhoria da
infraestrutura escolar.
"O
IBGE mostra que 17,5 mil escolas não têm nem banheiro em suas instalações.
Outras 7,5 mil funcionam sem energia elétrica, e 47 mil não têm internet", lamentou.
Entre
as modalidades de educação para índios e quilombolas, por exemplo, o
entendimento dos participantes de audiência pública promovida em Novembro pela
Comissão de Educação é de que o investimento público por aluno deve ser maior
nas escolas dos povos tradicionais. É o Fundeb que garante a educação escolar
em territórios marcados por alta vulnerabilidade, mas os recursos ainda são insuficientes.
Com
salário atrasado, a professora Maria José Sousa Silva, representante dos
quilombolas de Mirandiba (PE), ensina em uma sala de aula improvisada,
sem banheiro nem cozinha. Também falta transporte para as crianças, que,
de acordo com ela, caminham dois quilômetros debaixo do sol quente para receber
uma merenda de baixa qualidade.
"Existe esse apartheid dentro das escolas. Se nós estamos em um
município onde a maioria da população é negra, por que ainda não existe um
olhar específico para resolver essa questão?", questionou.
Para
o antropólogo Gersem Baniwa, do Foro Nacional de Educação Escolar
Indígena, o Fundeb garantiu a abertura de mais escolas para os índios, mas a
distribuição dos recursos seria influenciada por um “racismo geográfico”.
"O
aluno no extremo norte da Amazônia dificilmente terá o seu direito assegurado.
Simplesmente porque ele nasceu numa região de tremendas dificuldades. Existem
alunos que têm de arrastar canoas horas e horas, passar por cachoeiras para
poder chegar a uma escola", ressaltou Baniwa, que já foi professor bilíngue na
sua aldeia, na Amazônia, e chegou a ocupar o cargo de secretário municipal de
Educação.
Propostas
Foto: Roque de Sá/Agência Senado
Três
propostas de emenda à Constituição em análise no
Congresso (PECs 15/2015, 33/2019 e 65/2019), além de renovarem o Fundeb,
convergem ao prever duas mudanças significativas no modelo atual. A primeira
delas é a transformação do fundo em uma política pública definitiva, e não mais
um mecanismo provisório.
"Com o Fundeb estabelecido de forma definitiva na Constituição, teremos a
garantia de que as verbas para a educação básica, que é um direito de todos os
brasileiros, jamais serão retiradas", argumenta o senador Randolfe Rodrigues
(Rede-AP), autor da PEC 65/2019.
A
segunda mudança significativa prevista nas três PECs é o aumento das injeções
diretas do governo federal. O fundo, primeiro, recolhe as contribuições dos
estados e das prefeituras e, em seguida, cobra da União 10% do valor
arrecadado. Das propostas em estudo no Congresso, duas elevam a cota federal
para 30% e a outra, para 40%. Em todos os casos, a elevação ocorre de forma
gradual, diluída ao longo dos anos, até chegar à porcentagem estabelecida.
Uma
terceira mudança nas regras atuais é aventada pelos relatores das PECs. Para os
senadores Zequinha Marinho (PSC-PA) e Flávio Arns (Rede-PR) e a deputada
Professora Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO), existe espaço para tornar mais
justa a fórmula de distribuição da complementação federal.
Uma
das possibilidades é que o dinheiro da União deixe de ser aplicado no Fundeb
dos estados que ficam na lanterna do ranking do valor por aluno. Em vez disso,
passaria a ir diretamente para as cidades mais pobres, não importando o estado
em que se localizam. São cidades que arrecadam muito pouco com os impostos
municipais (como o IPTU e o ISS) e, por isso, não dispõem de quase nada, além
do Fundeb, para investir nos seus alunos.
Recursos
Nos
últimos nove anos, os 10% do valor do fundo repassados pela União não alcançam
um valor mínimo por aluno. Em 2019, essa participação representou R$ 14,3
bilhões. No texto substitutivo da Câmara (PEC 15/2015), apresentado pela
deputada Professora Dorinha, a proposta é triplicar a participação federal em
10 anos: para 15% em 2021, com acréscimos anuais de 2,5 pontos percentuais até
chegar a 40% em 2031. O impacto orçamentário total seria de R$ 279,8 bilhões ao
longo desses anos.
Além
dessa ampliação da contribuição já existente da União, outra proposta (PEC
33/2019) também destina novos recursos ao fundo, com um percentual, a ser
definido por lei, dos royalties do petróleo. O texto estabelece ainda que 60%
de cada fundo estadual seja destinado ao pagamento dos professores da educação
básica pública em efetivo exercício.
"É
uma forma de assegurar a prioridade da aplicação dos recursos dos fundos para a
remuneração e valorização dos professores, que são, ao fim e ao cabo, os
responsáveis diretos pelo sucesso das práticas de ensino e pela aprendizagem
dos alunos. Em outras palavras, o foco deve estar na sala de aula e na
valorização dos docentes e de seus saberes", diz o senador Jorge Kajuru
(Cidadania–GO), autor da proposta.
Já o
relator da PEC 65/2019, senador Flávio Arns, sugere que também componham o
Fundeb 20% dos recursos relativos ao 1% da arrecadação do Imposto de Renda (IR)
e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Este 1% é repassado todos
os anos pelo governo federal ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM) nos
meses de Julho e Dezembro.
O
senador explicita que o Brasil precisa investir mais em educação. O
investimento em estudantes dos 6 aos 15 anos na Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE) chega a US$ 8,63 mil anual por aluno. Já no
Brasil, é só de US$ 3,7 mil.
"Em
termos de qualidade, nossos alunos têm uma performance bem inferior aos
dos países da OCDE. Isso acontece em parte devido à grande disparidade
socioeconômica e de investimentos. E não é subfinanciando a educação que vamos
resolver o problema" afirma.
A
Comissão de Educação aponta ainda, como futuras fontes para o Fundeb
permanente, a redução das desonerações tributárias, o remanejamento de recursos
e uma reforma tributária progressiva.
Arns
alerta que, além de aprovar uma nova proposta prorrogando o Fundeb, será
preciso depois regulamentá-lo. Além disso, caberá ao governo federal
estabelecer as normas infralegais. Se esse processo não acontecer, o fundo
deixará de existir em 2021.
MEC
O Ministério
da Educação (MEC) é contrário ao aumento proposto pelo Legislativo dos atuais
10% para 40% na complementação da União no Fundeb.
"A
gente é a favor de gastar mais com educação, principalmente no ensino
fundamental. Queremos e apresentamos uma proposta factível, palpável e concreta
para que isso acontecesse. Estamos dispostos a aumentar os gastos, mas dentro
de critérios de desempenho técnicos", afirmou o ministro da Educação, Abraham
Weintraub, durante coletiva de imprensa em setembro.
Em
junho, o MEC propôs acréscimo progressivo até alcançar 15%, com a implementação
de critérios que melhorem o desempenho da educação básica atrelados à
eficiência na aplicação dos recursos. O aumento seria de um ponto percentual ao
ano.
Segundo
Weintraub, um modelo para o novo Fundeb está sendo construído junto com a Casa
Civil e o Ministério da Economia.
Fonte:
Agência Senado
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